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Governo muda regra e permite a aposentado em cargo de confiança ganhar mais que o teto

Medida apelidada de ‘teto duplex’ vai beneficiar, entre outros, presidente Jair Bolsonaro e ministros como Luiz Eduardo Ramos (Casa Civil) e Braga Netto (Defesa).

Uma portaria publicada na última sexta-feira (30) pelo Ministério da Economia vai permitir que o presidente da República, Jair Bolsonaro, e ministros como Luiz Eduardo Ramos (Casa Civil) e Braga Netto (Defesa) recebam acima do teto constitucional, atualmente em R$ 39,2 mil.

Segundo o ministério, a medida foi tomada após um entendimento da Advocacia-Geral da União (AGU) de dezembro do ano passado, e terá impacto de R$ 181,32 milhões já neste ano.

A nova regra trata da forma como deve ser verificado se as remunerações recebidas pelos servidores estão dentro do limite previsto na Constituição, o chamado teto constitucional. equivalente ao salário dos ministros do Supremo Tribunal Federal (R$ 39,2 mil).

Atualmente, um servidor aposentado e nomeado para um cargo comissionado recebe uma aposentadoria e um salário. Se a soma dos dois ultrapassar o limite de R$ 39,2 mil, é aplicado o chamado “abate-teto”, que impõe um desconto até a remuneração máxima ficar dentro do limite do teto.

Com a nova regra, a verificação será feita para cada remuneração. Se, separadamente, aposentadoria e salário estiverem abaixo do limite, ambos podem ser recebidos integralmente — e a soma pode superar o teto.

A regra recebeu de servidores da área de contabilidade do governo o apelido de “teto duplex” e vai beneficiar especificamente quem recebe dois salários altos o bastante para superar o teto remuneratório do governo federal.

Até agora, a verificação separada das remunerações era feita em casos específicos previstos na Constituição — médicos e professores do serviço público federal com dois cargos, por exemplo.

Com o novo entendimento, isso também valerá para servidores civis aposentados e militares da reserva que ocupem cargos comissionados ou eletivos. Porém, servidores efetivos e militares da ativa que ocupem cargos comissionados ou eletivos continuam sujeitos à regra antiga.

A Secretaria de Comunicação da Presidência da República disse que o assunto seria tratado pelo Ministério da Economia.

Consultada, a Casa Civil informou o seguinte: “A Portaria regulamenta, no âmbito do Poder Executivo, as decisões do Supremo Tribunal Federal (STF), nos Recursos Extraordinários n. 602.043/MT e n.612.975/MT, e Tribunal de Contas da União (TCU), Acórdão n. 1092/2019-TCU-Plenário. TODOS os servidores do Executivo serão abarcados pela nova medida que passou a valer na última sexta-feira”.

O Ministério da Defesa foi procurado sobre a remuneração do ministro e o número de militares que serão afetados pela medida, mas ainda não se manifestou.

Bolsonaro e ministros

O Ministério da Economia não quis avaliar o impacto da medida para servidores específicos, dizendo que “a regra vale para todos” e que não comentaria “casos pontuais”.

Mas especialistas ouvidos pelo G1 entendem que a medida beneficiará por exemplo, o presidente Jair Bolsonaro e ministros como Luiz Eduardo Ramos (Casa Civil) e Walter Braga Netto (Defesa).

“Isso foi para beneficiar, incorporar os militares. Eles estão fugindo dessa conversa porque o ambiente não é favorável à discussão. Como não estão dando aumento de remuneração, é um rearranjo interno e são essas decisões que vão criando inúmeras situações que vão fugir do teto”, diz Adriano Marrocos, conselheiro do Conselho Federal de Contabilidade.

General da reserva desde fevereiro do ano passado, Braga Netto sofreu nas remunerações de fevereiro deste ano um abate-teto de aproximadamente R$ 22,7 mil — valor que poderá receber a partir de agora.

Luiz Eduardo Ramos sofreu um abate-teto de aproximadamente R$ 27 mil.

O presidente Bolsonaro, que foi para a inatividade ainda como capitão, receberá cerca de R$ 2,3 mil a mais por mês com a nova regra.

Outros nomes ainda do primeiro escalão devem ser beneficiados, já que muitos militares da reserva integram cargos com altas remunerações no Executivo Federal.

Diana Vaz, professora do Departamento de Ciências Contábeis da Universidade de Brasília (UnB), alerta para as possíveis repercussões da medida, mesmo que seja apenas uma formalização do que vinha sendo decidido no Judiciário.

“Essa decisão não contribui para a sustentabilidade das contas previdenciárias, pois possibilita a ampliação de pagamento de benefícios que antes para se conseguir [o servidor] teria de entrar na Justiça, e agora seria apenas uma questão administrativa em atender a documentação exigida”, explica.

Para ela, houve uma omissão dos três poderes: do Legislativo, que deveria ter fechado esse caminho, do Judiciário, que deveria negar esses pedidos, e do Executivo, que deveria ser o gestor do equilíbrio das contas públicas.

Para a professora, medidas como essa devem ser pensadas no longo prazo. “A contradição é que o governo fez recentemente uma reforma para ter equilibrio das contas previdenciárias e agora aprova uma medida que abre a possibilidade do aumento das despesas, uma vez que dificilmente as receitas que entrarem trarão o equilíbrio financeiro e atuarial necessário para o equilíbrio da massa de segurados”, argumenta Diana.

Divergências no governo

O Ministério da Economia afirma que “a portaria tem por finalidade adequar o cálculo do teto remuneratório constitucional aos entendimentos jurisprudenciais do Supremo Tribunal Federal (STF) e Tribunal de Contas da União (TCU)”.

De acordo com a pasta, a aplicação dos entendimentos dessa decisão foi feita por um despacho do Advogado-Geral da União no último mês de dezembro e só vale para os salários a partir de agora, sem efeitos retroativos.

O despacho da AGU em que se baseou o ministério mostra que havia divergências no governo sobre o tema.

O Ministério da Defesa foi quem iniciou o debate, após ouvir as três Forças Armadas, e defendeu a mudança nas regras em janeiro de 2020.

Pedindo que a AGU se manifestasse, a Consultoria Jurídica da Defesa afirmava que a regra até então em vigor afrontava “a um só tempo, os princípios: da isonomia; da segurança jurídica; da unidade da Constituição (…) segundo o qual “onde há a mesma razão, aplica-se o mesmo direito”; e da força normativa e da máxima eficácia da Constituição”.

Dentro do Ministério da Economia, no entanto, havia divergências. O órgão central do Sistema de Pessoal Civil da Administração Federal (SIPEC) se manifestou em março do ano passado, dizendo que “restou concluído não haver fundamento legal que amparasse o direito de se receberem valores superiores ao teto constitucional, uma vez que a Constituição Federal vedaria a percepção de remuneração/proventos/pensão ou de qualquer outra vantagem acima do teto estabelecido”.

A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional argumentou que concordava com a Defesa, mas disse que seria necessário um novo entendimento da AGU sobre o tema para permitir a mudança nas regras.

Enquanto a AGU analisava o tema, o Planalto entrou na discussão. Em junho de 2020, a Secretaria-Geral da Presidência da República emitiu uma nota técnica pedindo que a AGU se manifestasse sobre o tema, o que ocorreu no último mês de dezembro.

Na ocasião, o então Advogado-Geral da União, José Levi, aprovou o novo entendimento. Com a portaria do Ministério da Economia, a regra passa a valer para todos os servidores atingidos.

Comunicação/Cal/Pública/2021

 

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