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Subsídios ao debate sobre a reforma administrativa – DIEESE

 

A Pública Central do Servidor dá visibilidade aos subsídios trazidos pelo DIEESE para o debate sobre a proposta de reforma administrativa do governo federal. 

A alegação do governo é a mesma usada para aprovar as reformas trabalhista e da previdência, ou seja, que ela é necessária para que o país volte a crescer. Como é visto e sentido pelo povo brasileiro, nenhuma das medidas anteriores teve qualquer força para impulsionar o crescimento da economia.  
A reforma administrativa é uma propositura com o objetivo de diminuir o tamanho do Estado, não para que ele seja mais ágil, mas para que o setor privado lucre com as atividades estatais. Para ganhar a opinião pública, ainda depreciam os serviços e os servidores públicos, usando informações falsas.  Os trabalhadores, por outro lado, têm propostas que podem garantir equilíbrio fiscal, além de ajudar o Brasil a retomar os rumos do desenvolvimento, com emprego, renda e inclusão social. 

REFORMA ADMINISTRATIVA DO GOVERNO BOLSONARO

Desde o início do governo de Jair Bolsonaro, têm sido implantadas no país várias ações que redesenham o Estado brasileiro. São medidas para privatizar o Estado, reduzir investimentos, a oferta de bens públicos, de serviços públicos, mesmo os essenciais, as políticas que combatem as desigualdades (entre homens/mulheres; negros/não negros; campo/cidade; LGBTI+; PcD; geracional etc.) e retirar direitos dos servidores (as).

Mesmo com o teto de gastos, estabelecido durante o governo de Michel Temer, Bolsonaro enviou ao Congresso Nacional, no fim de 2019, três Propostas de Emenda Constitucional que aprofundam a visão liberal do Estado (o chamado Plano Brasil Mais). Ainda em tramitação no Congresso Nacional, a reforma do governo tem como objetivo desvincular, desobrigar e desindexar o gasto público, além de submeter o orçamento à dívida pública e não às necessidades da população. São proposituras que diminuem as garantias orçamentárias previstas na Constituição Federal para os serviços públicos, especialmente na saúde e educação, e retiram direitos dos servidores públicos.

Nessa perspectiva, o governo apresentou uma proposta de Reforma Administrativa (PEC 32/20201) que procura acabar com o Regime Jurídico Único, regulador da relação dos servidores com a administração pública.

O debate público, diante da anêmica economia do país, tem sido pautado pelo interesse do “mercado” e da grande mídia, que condenam os gastos públicos e depreciam a atuação dos servidores, propondo uma agenda de “Estado Mínimo” como solução para os problemas brasileiros.

Bem diferente do discurso da mídia e do governo, o número de servidores públicos em relação à população brasileira está abaixo do verificado em muitos países desenvolvidos. E em relação aos rendimentos, a maior parte dos funcionários públicos (57%) tem rendimentos concentrados na faixa de até 4 salários mínimos, ou seja, de R$ 3.816,00 (dados de 2018). No serviço público municipal, o percentual dos que auferem este rendimento corresponde a 73%, faixa na qual estão concentrados 56% dos servidores estatutários do Brasil (RAIS, 2018).

O governo utiliza a premissa de que é preciso realizar a reforma administrativa para o Brasil crescer. A alegação foi a mesma com a Emenda Constitucional 95 (congelamento salarial), com as reformas trabalhista e da previdência. Como é visto e sentido pelo povo brasileiro, nenhuma dessas medidas teve qualquer força para impulsionar o crescimento do país.

As reformas representam a disputa pelos recursos públicos e reduzem o caráter redistributivo do Estado. O objetivo é diminuir o tamanho do Estado, não para que ele seja mais ágil, mas para que o setor privado lucre com as atividades que antes eram públicas. O resultado desse modelo voltado para o mercado é o baixo crescimento, a instabilidade econômica, o aumento da dificuldade do Estado para desenvolver políticas estratégicas para o país, a ampliação da pobreza e da concentração de renda.

O que está em jogo é quem pagará pelos custos da crise econômica, sanitária e social que o país atravessa: os trabalhadores privados e públicos ou a elite, por exemplo, por meio da taxação das grandes fortunas.

O governo tenta reduzir a rejeição ao projeto dizendo que os atuais servidores públicos não serão afetados, no entanto, a estabilidade condicionada ao “desempenho insatisfatório” e o fim da progressão por tempo de serviço, em alguns casos, são exemplos de pontos presentes na PEC 32 que afetarão o funcionalismo na ativa hoje. Sem contar que é inaceitável uma mudança que precariza as condições de trabalho dos servidores e o atendimento à população, mesmo que no futuro.

Na perspectiva dos trabalhadores, as medidas de equilíbrio fiscal deveriam passar por:

  • Políticas voltadas para o crescimento econômico com inclusão social;
  • Medidas de controle de gastos para as despesas nominais das contas públicas, promovendo maior controle dos dispêndios financeiros, especialmente dos juros da dívida;
  • Auditoria da dívida pública;
  • Combate efetivo à sonegação;
  • Reforma tributária com progressividade, com maior tributação sobre a renda e o patrimônio, tributação sobre grandes fortunas, redução dos impostos sobre o consumo, observando a capacidade contributiva;
  • Revisão das isenções fiscais;
  • Cumprimento efetivo do teto constitucional para salários dos servidores públicos;
  • Garantia de recursos do pré-sal para ampliar investimentos em saúde, educação e infraestrutura;
  • Regulamentação do artigo 165 da Constituição Federal de 1988, estabelecendo um ordenamento das prioridades na construção e execução orçamentária;
  • Promoção do controle social e da transparência de informações do gasto público.

PRINCIPAIS MUDANÇAS PROPOSTAS NA REFORMA ADMINISTRATIVA

  • Eixos elementares:
    • Dificulta o acesso à estabilidade;
    • Cria a avaliação de desempenho;
    • Abre espaço para o fim do regime jurídico único, especialmente no que diz respeito à previdência, já que possibilita incluir novos servidores no Regime Geral da Previdência Social;
    • Reduz a remuneração média no decorrer da carreira, ao retirar progressões por tempo de serviço e/ou automáticas;
    • Aumenta o poder discricionário do Executivo para extinguir cargos, funções, benefícios e instituições;
    • Amplia a possibilidade de contratação de temporários e possibilita aumento de terceirizações;
    • Facilita as privatizações ao retirar do Legislativo a responsabilidade por esse processo e inclui como atribuição privativa do presidente da República a “extinção, transformação e fusão de entidades da administração pública autárquica e fundacional” (Inciso IV, art. 84, PEC 32/2020).
  • A PEC prevê o fim do chamado “regime jurídico único” para futuros servidores e institui cinco modalidades:
    • Cargo típico de Estado: estabilidade após três anos; reservado a postos considerados estratégicos do funcionalismo público;
    • Cargo por prazo indeterminado: sem estabilidade, destinado a servidores de apoio administrativo; ingresso por concurso público;
    • Vínculo de experiência: período de experiência com avaliação de desempenho por, no mínimo, dois anos para cargos típicos de Estado e de um ano para cargos com prazo indeterminado. Mesmo depois de passado esse período, o trabalhador não terá direito automático ao posto de
    • Vínculo de prazo determinado: para as contratações de servidores temporários, sem direito à estabilidade, o ingresso será por meio de seleção simplificada. Amplia as situações em que podem ocorrer contratações temporárias;
    • Cargo de liderança e assessoramento: substitui os cargos comissionados e funções gratificadas. Também não possuí
  • A definição de novas regras de ingresso no serviço público significa, com exceção das Carreiras típicas de Estado, que haverá outras formas de ingresso diferentes da atual, que se dá somente via concurso público. Aliás, ao retirar o concurso público como forma predominante de ingresso no setor público, há sérias ameaças ao princípio da “impessoalidade”;
  • Não estão incluídos: magistrados, parlamentares e militares. Trabalhadores (as) dos poderes judiciário e Legislativo seriam atingidos pela reforma. 
  • O governo tem anunciado que a atual reforma administrativa também não valeria para trabalhadores (as) na ativa, mas somente para servidores que ingressarem no serviço público pós- aprovação. Porém, é necessário ter atenção: podem ser iniciados esforços, com modificações nas legislações vigentes, para alterar regimes de trabalho e benefícios para servidores na ativa. A proposta de reforma não elimina a possibilidade de modificação das regras para aqueles que, em teoria, estão isentos, incialmente, das mudanças;
  • Se aprovadas, as novas regras valem para as três esferas: União, estados e municípios;
  • Proporciona mais poderes para extinção de cargos, gratificações, funções e órgãos;
  • Pode haver também demanda prévia de conhecimento técnico;
  • Acaba com gratificações automáticas por tempo de serviço:
    • Licença-prêmio. Depois de cinco anos de trabalho, o servidor tem direito a três meses de licença;
    • Aumentos retroativos;
    • Férias superiores a 30 dias por ano;
    • Adicional por tempo de serviço;
    • Aposentadoria compulsória como punição;
    • Parcelas indenizatórias sem previsão legal;
    • Adicional ou indenização por substituição não efetiva;
    • Redução de jornada sem redução de remuneração, exceto por motivo de saúde;
    • Progressão ou promoção baseada exclusivamente em tempo de serviço;
    • Incorporação ao salário de valores referentes ao exercício de cargos e funções.
  • Abre a possibilidade de substituir várias funções (ainda que não se permita naquelas consideradas típicas de Estado) concursadas por temporários ou mesmo da iniciativa privada;
  • Ao autorizar o acúmulo de cargos para ocupantes de carreiras não típicas, deve-se ter em vista que isso pode significar precarização dos vínculos dos servidores, especialmente no que diz respeito a jornada de trabalho e salários;
  • Abre espaço para a incorporação ao RGPS (Regime Geral de Previdência Social) de novos servidores;
  • Não permite mais a incorporação de remuneração em cargo de comissão: com efeitos negativos na aposentadoria e previdência dos servidores;
  • Amplia a possibilidade de convênios entre o setor público e entidades privadas através de Parcerias Público-Privadas, as PPPs, que permitem deslocar servidores para atividades diferentes daquelas às quais os funcionários são vinculados;
  • A proposta de reforma coloca que os afastamentos e as licenças dos servidores não poderão ser consideradas para fim de percepção de remuneração de cargo em comissão ou liderança, assessoramento, função de confiança, gratificação de exercício, bônus, honorários, parcelas indenizatórias ou qualquer outra que não tenha caráter permanente (parágrafo 16, artigo 37), com exceção dos casos previstos em lei (afastamento por incapacidade do trabalho, cessão ou requisição ou ainda afastamento a serviço do governo).

PRINCIPAIS CONSIDERAÇÕES SOBRE A PROPOSTA DE REFORMA ADMINISTRATIVA 

  • A proposta de reforma deve ser observada pela ótica política, nesse primeiro momento, dada a negociação com o chamado Centrão. Alguns temas que estavam na agenda do governo ficaram de fora, mas existe a indicação, no discurso governamental, de que novos projetos serão enviados. O processo de reforma administrativa, portanto, será dividido em etapas;
  • De forma objetiva, a reforma visa criar formas de contrair o setor público diferentes das que existem atualmente, a exemplo do que já ocorreu na reforma trabalhista, voltada para o setor privado, em 2017.
  • Além disso, busca maneiras legais de reduzir os salários (inicialmente) dos ingressantes, assim como permitir maior flexibilidade do manejo de pessoal. Mesmo quando reafirma os direitos existentes sobre os “Servidores da ativa em ocupações típicas de Estado”, na verdade, abre espaço para flexibilização de todos os regramentos sobre os servidores em funções não típicas. Mesmo essa suposta segurança para as carreiras típicas é ilusória: a própria definição deste tipo de função será objetivo de regulamentação posterior;
  • Atacar o Regime Jurídico Único, especialmente a estabilidade, é o foco principal da reforma, por meio de novos contratos que produzirão condições ainda mais distintas de admissão, além das já fartamente utilizadas pelo poder público (fundações, OS – Organizações Sociais e Oscips – Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público, cooperativas, autônomos, consultores, trabalho terceirizado, sem carteira assinada). Isso significa aumento do número de alternativas de admissão fora do emprego estatutário tradicional no setor público, abrindo um leque para formas de contratações precárias, que podem ser utilizadas de forma direta;
  • A facilidade de contratação de temporários deve ser vista com muitas ressalvas, principalmente a partir dos critérios pelos quais será adotada. Sob a justificativa de agilidade em situações de emergência, a reforma abre a possibilidade de contratação em cargos que deveriam exigir permanência, para garantir a qualidade do serviço público, como, por exemplo, em universidades (professores temporários, que recebem muito menos do que os titulares dos cargos);
  • Quem definirá critérios para:
    • Avaliação de desempenho;
    • Possibilidade de contratação de temporários;
    • Acesso a cargos de liderança e
  • Permite Lei Complementar que versaria sobre políticas de pessoal no setor público, na linha da desconstitucionalização, da mesma forma que foi utilizada como estratégia na PEC da reforma da previdência. Lei complementar é instrumento muito mais fácil de aprovação congressual (maioria simples) do que mudanças na Constituição. Assim, é necessário observar o escopo completo das possibilidades de mudanças;
  • Ainda que o projeto vete o desligamento do funcionário público por motivação partidária, a regra que define a avaliação de desempenho dá espaço para pareceres subjetivos e pode se tornar um caminho para desligamento de servidores, de forma disfarçada, por razão partidária ou ainda em caso de atividade sindical;
  • Veta militares da ativa de assumir cargos civis. A menos que as atividades estejam ligadas à saúde e ao magistério, para assumir postos civis, os militares devem passar para a reserva;
  • Ao retirar do Legislativo a atribuição pelos processos de privatização, facilita a venda do patrimônio público, uma vez que o processo no Congresso passa por tramitação, votação em plenário e debate público;
  • Não permite regras de estabilidade nas empresas públicas diferentes daquelas que são aplicadas nas empresas privadas, ou seja, o entendimento segundo o qual a dispensa do empregado público deve ser motivada fica prejudicado. A negociação coletiva não poderá estabelecer condições diferentes do que é feito no setor privado em relação a isso;
  • Apesar de a reforma não ser válida para os servidores em atuação hoje, aqueles que ainda não obtiveram a estabilidade, mesmo na função antes da Reforma, podem ser submetidos a essa nova avaliação de desempenho definida na PEC, como critério para obtenção de estabilidade;
  • O parágrafo 16 e 17 do artigo 37 se constitui em ataque direto ao sindicalismo no setor público e indireto àqueles que se afastam devido a outros motivos que não os previstos, já que impede a progressão funcional e salarial em casos fora dos previstos constitucionalmente;
  • Nas empresas estatais, impede a garantia de estabilidade no emprego ou proteção contra despedida via negociação coletiva com os sindicatos de trabalhadores (artigo 173, parágrafo 7º);
  • Devem ser vistos com muita preocupação os parágrafos 18 e 19 do artigo 37, que preveem necessidade de provisionamento de recursos, pelos municípios com menos de 100 mil habitantes, para a contratação de cargos em comissão e livre;
  • O artigo 9º da PEC define que “A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão optar por vincular, por meio de lei complementar publicada no prazo de dois anos, contados da data de entrada em vigor desta Emenda à Constituição, os servidores que vierem a ser admitidos para cargo com vínculo por prazo indeterminado, nos termos do inciso III do caput do artigo 39-A, inclusive durante o vínculo de experiência, ao regime geral de Previdência Social, em caráter irretratável”. Ou seja, permite inserção de servidores nas carreiras consideradas “não típicas” no RGPS, mesmo na existência de regime próprio, desde que com lei complementar, o que irá corroer as bases de financiamento do Regime Geral;
  • Abre possibilidade de extinção dos conselhos de pessoal, com redução da participação dos servidores nos municípios, estados e no DF, devendo todos os entes seguirem as regras definidas pela União, já que coloca em lei complementar neste ente a definição sobre as regras gerais de pessoal, aumentando inclusive o poder discricionário geral deste organismo sobre o funcionalismo.

Clique no link abaixo e leia a síntese do DIEESE na íntegra

Síntese Especial DIEESE

Comunicação/Cal/Pública/2020

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