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Sem regra de transição, Reforma da Previdência será nula

Na primeira semana de junho, em manifestação no Congresso Nacional e para defender a proposta governista de Reforma da Previdência, o Ministro Paulo Guedes apontou um inimigo a ser abatido: o gato gordo.

Se não fosse trágico, seria cômico. Mas o grotesco tem sido a via preferencial de interlocução do governo federal com a sociedade brasileira e o gato gordo foi incluído no repertório folclórico que já abriga desde goiabeira até performance artística, passando por delírios terraplanistas, dentre muitos outros estratagemas midiáticos voltados ora à captação ora ao desvio das atenções.

A comunicação de choque é sem dúvida um caminho impactante, que tem a capacidade de atrair a atenção do interlocutor. Contudo, é instrumento que deve ser usado com parcimônia, pois o abuso, notadamente para o trato de temas sérios, provoca, com o tempo, duas reações certas do público: a indiferença e a perda de credibilidade.

O recurso frequente à comunicação de choque produz indiferença porque sua utilização repetida naturaliza o insólito e deixa de chamar a atenção dos receptores da mensagem; abala a credibilidade, de outra parte, na medida em que o emissor da mensagem desmoraliza o próprio discurso ao tratar o outro de modo jocoso ou desproporcionalmente depreciativo.

Pois nesse exercício repetitivo de apelo ao grotesco a que temos sido submetidos pelo Governo Bolsonaro, o gato gordo do Ministro Guedes, além de margear a indiferença e minar a confiança na mensagem transmitida, retrata o vazio de argumentos do governo para a proposição da PEC 06/2019sem regra de transição para quem já é trabalhador ou servidor público.

O gato gordo, aquele bicho indolente, espertalhão e aproveitador, é para o Ministro da Fazenda o retrato do(a) trabalhador(a) que requer ou recebe benefício de aposentadoria antes dos 65 anos de idade. É também a figura daquele(a) que, com 48 anos de idade ou mais, e já próximo(a) de completar 30 ou 35 anos de trabalho, pretende que o Congresso insira no texto da Reforma da Previdência regra de transição apta a modular a passagem para a inatividade desse segmento de trabalhadores.

Se o Ministro quis chamar a atenção para o perigo que esse animal trabalhador- público ou privado- representa para o país, de cara escolheu o bicho errado como imagem do risco. Afinal, o gato, em especial o gordo, é um bicho de estimação, daqueles considerados membros da família; é bonito, tranquilão e não tem histórico de perturbador. Como poder ser o símbolo do caos?

Afinal, quem está com a razão não precisa apelar pra ignorância.

Depois, o esforço para desprestigiar o trabalhador, associando-o à figura de um animal, preconceituosamente retratado como indolente e aproveitador, dado o intento desrespeitoso e agressivo da mensagem, mina a credibilidade do discurso governamental. Afinal, quem está com a razão não precisa apelar pra ignorância.

Nessa disputa de narrativas que envolve o debate sobre a Reforma da Previdência, é preciso compreender que a fixação de regra de transição não é uma escolha juridicamente possível para o governante ou mesmo para o legislador. Pelo menos não dentro da constitucionalidade democrática.

Não há bravata ministerial que exclua do mundo jurídico o primado da legítima expectativa, da justa expectativa, da proteção da confiança, da segurança jurídica, conceitos de forte conteúdo ético que talvez o olhar unicamente monetarista não possa alcançar.

Ao adotar princípios constitucionais como a dignidade da pessoa humana, o valor social do trabalho, a legalidade e a moralidade, o Estado brasileiro compromete-se com valores que compõem o chamado Estado Democrático de Direito, onde há limites para a ação estatal.

Dentre os limites próprios ou ínsitos ao Estado Democrático de Direito encontramos o princípio da Justa Expectativa, da Proteção da Confiança ou da Segurança Jurídica.

O Princípio da Justa Expectativa ou da Proteção da Confiança impõe a ação proba e responsável do Estado, o que importa o respeito à Justa Expectativa de ter respeitado um direito legalmente prometido, de ver honrado um compromisso formalmente assumido.

Daí que pretender mudar as regras do jogo da aposentadoria sem o estabelecimento de regra de transição para quem ingressou na vida laboral antes da Reforma é conduta estatal juridicamente inaceitável, porque equivalente à improbidade, ao passa-moleque, ao calote aplicado contra o cidadão.

A Pública Central do Servidor está promovendo em todos o pais debates sobre a reforma da previdência e seus impactos para os servidores e a sociedade brasileira.

Fonte: Justificando.

Comunicação /Pública.

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